O paradoxo da morte: Uma análise comparativa entre kagaya ubuyashiki e muzan kibutsuji

A narrativa de Kimetsu no Yaiba (Demon Slayer) frequentemente explora temas complexos sob a superfície da batalha entre caçadores e demônios. Um dos paralelos mais profundos e reveladores reside na forma como seus líderes centrais, Kagaya Ubuyashiki e Muzan Kibutsuji, encaram a própria finitude.

A negação da fragilidade como motor da tirania

Muzan Kibutsuji, a origem de todo o mal na série, define sua existência milenar por uma única obsessão: escapar da morte. Sua jornada, que gerou incontáveis sofrimentos e a morte de bilhões de pessoas, é motivada pela incapacidade de suportar a própria vulnerabilidade perante a luz do sol. Este medo paralisante o obriga a se esconder nas sombras, transformando-o em um tirano que sacrifica qualquer laço ou indivíduo, inclusive aqueles mais próximos a ele.

O custo dessa invulnerabilidade forçada é a aniquilação de sua humanidade. Musik, ao se tornar um demônio, adota uma postura de completa negação da morte. Ele vê a vida apenas como um meio para perpetuar sua existência, usando seus servos mais poderosos, as Luas Superiores, puramente como escudos protetores e ferramentas de luxúria, sem demonstrar qualquer apego real a eles.

A aceitação da morte como catalisador da esperança

Em forte contraste, a abordagem de Kagaya Ubuyashiki, o líder dos Caçadores de Demônios, se estabelece na aceitação ativa de seu destino. Kagaya, mesmo sendo um homem doente e com uma expectativa de vida limitada, não teme o fim, mas sim o momento inadequado dele.

Sua preocupação não reside em sua própria sobrevivência, mas sim em garantir que sua missão seja concluída e que seus 'filhos' - os membros da organização - estejam seguros e capazes de prosseguir. Ele utiliza sua própria morte iminente como uma ferramenta estratégica, um sacrifício planejado. Este contraste demonstra que a verdadeira força não está em evitar o fim, mas em como se vive e se morre.

Diferentes formas de liderança

A maneira como cada um trata seus subordinados mais próximos espelha suas visões sobre a mortalidade. Enquanto Muzan mantém suas Luas Superiores sob medo constante, exigindo lealdade absoluta em troca de uma sobrevida instável, Kagaya exerce liderança através da inspiração e do propósito maior. O líder dos caçadores nunca buscou guardas pessoais, confiando na estratégia e na ocultação, priorizando o bem coletivo em detrimento de sua segurança pessoal.

Essa dicotomia ressalta a mensagem central da obra de Koyoharu Gotouge: O medo absoluto da perda - seja de si mesmo ou daqueles que se ama - molda fundamentalmente as escolhas morais. A busca incessante de Muzan pela longevidade o condenou à crueldade, ao passo que a rendição de Kagaya à sua mortalidade permitiu-lhe forjar um legado de sacrifício e heroísmo na luta contra a escuridão.