A utopia de fantasia como um leviatã hobbesiano: Uma análise política em berserk
Exploração de como o reino de Griffith em Berserk reflete a teoria do Estado absoluto de Thomas Hobbes e o contrato social.
Um paralelo surpreendente surge ao analisar a estrutura sociopolítica do reino de Fantasia, apresentado na obra Berserk, e o conceito do Leviatã delineado pelo filósofo político Thomas Hobbes. A teoria hobbesiana postula a necessidade de um soberano absoluto para garantir a paz e evitar o estado de natureza, onde a vida seria, em suas palavras, solitária, pobre, sórdida, embrutecida e curta.
Neste contexto, o estado idealizado por Griffith, que une humanos e apóstatas sob sua liderança após o Sacrifício, assemelha-se notavelmente a essa construção teórica. Os habitantes de Fantasia consentem, tacitamente ou explicitamente, em entregar seus direitos individuais em prol de uma segurança e ordem garantidas pelo governante supremo.
O Contrato Social em Fantasia
O cerne da comparação reside no contrato social implícito. Assim como Hobbes teoriza que os indivíduos renunciam à sua liberdade ilimitada em troca de proteção estatal, os cidadãos sob o domínio de Griffith abrem mão de certas autonomias. Griffith, como soberano, detém o poder absoluto necessário para manter a pax fantasiaca. Ele é a única autoridade capaz de determinar as leis e os meios pelos quais a paz daquele domínio será preservada.
Essa centralização de poder é crucial. Em uma filosofia que vê a natureza humana como inerentemente egoísta e propensa ao conflito, apenas uma força inquestionável - um Leviatã - pode impedir a sociedade de regredir ao caos. Griffith se posiciona acima de qualquer julgamento moral ou legal dentro de seu domínio; sua palavra é a lei, e seus atos, por mais drásticos que sejam, são justificados pelo bem-estar coletivo que ele assegura.
A Ausência do Estado de Natureza Externa
A dualidade entre a ordem interna de Fantasia e o mundo exterior reforça essa interpretação. O exterior, desprotegido pela soberania de Griffith, opera sob as regras implacáveis da guerra de todos contra todos - o estado de natureza puro que Hobbes descrevia. Fantasia, portanto, funciona como um refúgio, um experimento social que demonstra a eficácia do poder concentrado, ainda que obtido por meios questionáveis.
A análise sugere que a fascinação em torno da tirania benevolente ou, pelo menos, eficaz, ecoa profundamente na filosofia política clássica. O sacrifício de liberdades em nome da segurança é um dilema constante, e a criação deste reino utópico e opressor na narrativa de Berserk funciona como um estudo de caso vívido dessas tensões filosóficas. A estrutura de Fantasia não apenas protege seus cidadãos, mas também os define como súditos leais a uma autoridade que se coloca como a origem da própria civilidade.