Análise profunda do destino de griffith e a natureza da humanidade em berserk

Uma exploração das complexidades temáticas do mangá Berserk levanta questões profundas sobre o livre arbítrio e o propósito existencial, centrando-se na figura de Griffith e sua transmutação em Femto, o arauto da nova ordem mundial.

A perspectiva central sugere que, no universo criado por Kentaro Miura, a vida humana é inerentemente frágil e desprovida de significado intrínseco. Diante da dor existencial avassaladora, a maioria dos seres humanos necessita de um propósito superior dado externamente. É nesse vácuo que surge a intervenção da Godhand, oferecendo um destino ou um foco que torna a existência suportável.

A inevitabilidade do sacrifício de Griffith

Sob essa ótica, o sacrifício realizado por Griffith durante o Eclipse não seria um ato genuinamente moralmente significativo, mas sim a conclusão de um destino pré-escrito. Argumenta-se que Griffith possuía pouca ou nenhuma agência sobre aquela decisão. Sua trajetória era desenhada para culminar no momento exato em que ele renunciaria à sua humanidade para ascender a Femto. Culpar Griffith, portanto, seria análogo a culpar a água por ferver a 100 graus Celsius, pois o ato era uma consequência direta do seu propósito existencial, determinado pela convergência de forças cósmicas e talvez pela própria vontade coletiva da humanidade.

Se Femto não é mais Griffith, mas uma máquina heroica criada para satisfazer a ânsia de salvação da humanidade, sua culpabilidade é mitigada. O ato controverso do estupro de Casca, embora chocante, pode ser interpretado como um evento ocorrido no meio do Eclipse, onde as regras da causalidade são suspensas. Miura historicamente borrou as linhas entre destino e escolha, e essa ambiguidade marca os eventos mais traumáticos da obra.

Falconia: A utopia dolorosa

O surgimento de Falconia, a cidade utópica orquestrada por Griffith 2.0, é visto como um reflexo da demanda humana por ordem e significado. Antes de sua ascensão, o mundo de Berserk é retratado como um lugar onde tanto a realeza quanto os cidadãos comuns sofrem de dor existencial implacável. O Rei de Midland, apesar de sua posição, era um homem solitário; ambiciosos como Foss buscavam poder sem substância; e classes menos favorecidas, como visto no exemplo da gangue de Gambino, recorriam à violência e a bodes expiatórios para lidar com o sofrimento mimético, um ciclo destrutivo de descontentamento.

A transformação visual no mangá reforça essa interpretação. Personagens pré-Griffith 2.0 são frequentemente descritos com traços repulsivos, pele doentia e dentes desalinhados. Em contraste, após o retorno do Falcão, personagens como Sonia e Mule adquirem uma beleza quase de anime, indicando que a chegada de Griffith trouxe esperança e um motivo para a vida. Mule, em particular, demonstra como a aceitação fervorosa de um propósito maior, mesmo que ilusório, confere brilho à existência.

O Caminho de Guts

A grande questão que paira é se o caminho do protagonista, Guts, invalidará a promessa da Godhand. Enquanto Guts encontra seu propósito na defesa imediata daqueles que ama, uma razão de viver temporal e pessoal, isso não anula a promessa cósmica de dar sentido àqueles que não conseguem forjar um por si mesmos. Sugere-se que a jornada de Guts pode culminar não na aniquilação de Femto e na destruição de Falconia, mas sim na salvação de Casca e na retirada para uma vida pacífica, garantida pela estabilidade estabelecida por Griffith.

O cerne da obra, então, não é necessariamente a vitória do bem sobre o mal, mas sim a coexistência de duas verdades válidas: a busca pessoal por conexão e a necessidade humana de um propósito transcendente.